Puteiro em Vegas

quarta-feira, 1 de julho de 2009


(Lamara Disconzi)


Esta é a história de como eu, uma reles prostituta, fiquei rica.
Tudo começa com um homem franzino, um velho, cercado de pessoas que o observavam fascinadas. Considere que esse homem está prestes a ganhar um milhão de dólares e tudo que ele precisa fazer é escolher o número certo. Se ele o fizer, a pilha de fichas, acumuladas entre diversas jogadas perdidas e ganhas, dobrará de tamanho, o que por certo levará aquela espelunca de quinta categoria à falência.
Imagine um homem que jamais, em toda sua patética existência, cogitou obter tal quantia. Pense que, agora, essa ideia lhe parece tão próxima que ele pode sentir o cheiro.
Não que o dele seja um daqueles lances de sorte de principiante. Morando em Nevada, onde cassinos e capelas 24 horas são as principais atrações, a jogatina já havia se tornado um hábito quase diário.
Imagine que esse idiota recebe uma miséria de aposentadoria e que ele se dedica a tentar aumentar essa quantia o tanto quanto pode para comprar qualquer tipo de droga que o tire da sua triste realidade.
Estes são seus vícios. Esta é sua vida.
Mas pense que, justo nesse dia a sorte desse bastardo resolve mudar. Imagine que ele virou a noite jogando na mesma mesa, saindo apenas para ir ao banheiro, onde certamente havia cheirado algumas carreirinhas brancas para se manter ligado.
Agora ele sua, feito o porco que é, com a expectativa de quebrar a banca. Imagine seus olhos vidrados pelo efeito da droga fitando o feltro verde, enquanto tenta decidir o pequeno quadrado onde depositará todas as suas fichas.
Considere que ele, por fim, escolhe um número aleatório e cruza os dedos magros, observando a bolinha branca girar, girar e girar na direção contrária da roleta e cair, precisamente, no número três. O seu número da sorte.
Ele permanece imóvel por diversos segundo antes de berrar aos quatro cantos que está rico. Imagine que seus mais novos amigos o ovacionam na esperança de ganhar alguma esmola.
Ainda incrédulo, recolhe as moedas de plástico e as leva até o caixa, onde as troca por dois grandes sacos de papel pardo lotados de cédulas verde-musgo.
Imagine que este imbecil sai do cassino, sendo surpreendido pelo sol escaldante do verão seco do deserto, e caminha até seu Pontiac azul.
Considere, então, que ele está sentado no banco do motorista, os dois sacos cuidadosamente posicionados ao seu lado, respirando fundo diversas vezes enquanto tenta fazer a cabeça parar de girar. Pense que ele já sabe exatamente a primeira coisa que precisa fazer agora que está rico.
Este homem, esqueci dizer, possui ainda mais um vício: mulheres. Putas pagas, para ser mais exata. Não foi por isso que sua mulher o havia abandonado há muito, mas certamente ajudou; não foi por isso que ele acabou por levar a única filha para morar num trailer imundo porque não podia pagar o aluguel, mas é possível que tenha feito parte; não foi por isso que essa mesma filha fugiu de casa muito antes de atingir a maioridade, mas não acho que tenha sido mera coincidência.
Mas agora ele pensa que faz tempo que ele não sente a pele nua e úmida de uma mulher em contato com seu corpo flácido.
Aquele tarado carente.
Então lembre que agora ele tem muito dinheiro e não precisa se contentar com pulgueiros e prostitutas velhas e esgaçadas. Ele pode ter acesso a putas de luxo, siliconadas e bronzeadas, daquelas que usam perucas para imitar um cabelo perfeito. Daquelas que parecem atrizes de cinema. E é só nisso que ele consegue pensar.
Imagine que esse homem escolhe justamente o puteiro no qual eu trabalho. E eu dou o azar de ter esse idiota mandado para o meu quarto. E agora pense que antes disso ele estava no salão de baixo bebendo whisky e cheirando pó, enquanto babava em outras putas que dançavam no seu colo por gorjetas. Imagine que está tão bêbado que não dá ouvidos aos meus berros insistindo, implorando, para que ele pare.
“Por favor, não!”, digo.
Imagine que suas mãos ásperas agarram todas as partes do meu corpo, enquanto eu quase vomito.
“Por favor, pare!”, grito.
Imagine que durante esse frenesi seus braços magros estão mais fortes que nunca e ele me aperta cada vez mais, enquanto tento, em vão, empurrá-lo para longe de mim.
“Por favor, saia!”, suplico.
Imagine que ele só pára quando chega ao fim dentro de mim.
Apenas nesse momento ele levanta o olhar para minha face. Considere que ele me reconhece; que ele começa a chorar e balbuciar coisas sem nexo; que ele se lamenta vergonhosamente sobre a merda que acaba de fazer.
Imagine que ele me pede desculpas, enquanto o olho com nojo através das lágrimas; que ele me entrega as chaves de um Pontiac azul; que ele sai correndo gritando loucuras.
Pense que ele chegue a seu trailer e passa a procurar freneticamente por algo. Considere que esse algo, um revólver, é frio e pesado em suas mãos trêmulas. Imagine que ele puxa o gatinho e que a bala sai precisamente no apertão número três para dentro de sua boca.
Aquele sortudo filho de uma puta.
E é assim que ele morre, deixando um milhão de dólares para mim, a filha que ele acaba de estuprar.

2 comentários:

Kaka' disse...

Lami!!
Boh, tu escreve muito! Sério, li hoje teus dois contos, me prenderam, li tudo de uma vez só até o fim.
Favoritei já ;D
Bjoo!

Erica Kirst disse...

cruzesssssssss

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